domingo, 16 de junho de 2013

Capítulo Um - Sendo Transformada

-Willian, está na hora.
-Pois não? – Ele abaixou a cabeça enquanto esperava sua ordem.

A luz estava apagada, a única coisa que iluminava a sala era uma vela grossa com sua chama potente. A vela estava posicionada ao lado direito do trono acinzentado com detalhes dourados. Esse era o mestre. O mais velho dos vampiros, estava prestes a completar cinco séculos e as decisões mais importantes eram determinadas por ele, como, por exemplo, decidir quem seria transformado em vampiro.


-A Belchior.
-Perdão? – Willian não pode evitar de olhá-lo nos olhos.
-Sim, Willian, está decidido. É ela. – Sua voz possuía um tom forte e sequer falhava – Ela é a próxima vampira.

Willian assentiu com a cabeça, se levantou e pediu licença. Ao se retirar do aposento isolado soltou um forte suspiro. Ele teria que transformá-la. Era sempre ele quem transformava. Mas ela? Ele caminhou lentamente para o exterior de uma pequena casinha construída especialmente para Heitor. Do lado de fora estavam alguns vampiros-muralhas. Eles eram altos e fortes, e isso era necessário para a proteção de alguém importante.
Júlio, um vampiro magro e inteligente é o conselheiro de Heitor. Willian, ele e os guardas eram os únicos a ter contato com o vampiro mestre. Ao passar por Júlio, viu-o andando rapidamente de encontro ao mestre para ver se ele precisaria de algo.
Ele cumprimentou os guardas e se afastou lentamente até chegar ao carro. Jorge estaria o esperando ali cerca de 5 minutos. O carro estava aproximadamente a dez metros de distância da porta larga de madeira que servia de porta principal para a casa de Heitor.
Willian abriu a porta do carro e rapidamente pulou para dentro e esperou Jorge dar a partida. Eles se afastaram do terreno particular em pouco tempo e Willian não tinha aberto sua boca, parecia pensativo e, quem sabe, decepcionado.

-Qual o problema? Não vai transformar ninguém? – Jorge se atreveu, mas ainda atento a estrada.
-É a vez dela... – A voz de Willian era quase muda, seu amigo teve que fazer um esforço absurdo para ouvi-lo.
-Ela? Quero dizer...
-Eu achei que ela se safaria. Por que ela?
-Isso significa que vamos direto para a cidade? – Jorge ignorou a pergunta de Willian.
-Significa sim. – O vampiro de cabelos longos encostou sua cabeça no banco.

Jorge não pronunciou nenhuma outra palavra e não dirigia com pressa. Passava das 03h da manhã, é claro que não haveria ninguém na rua e ninguém notaria um homem entrando pela janela. Willian ainda estava quieto. Jorge não fazia ideia de quem era a garota que Willian se referia, e por que diachos isso o incomodava tanto.

-Willian, você precisa me dizer onde é a casa.
-É na rua da biblioteca, a única casa salmão e branca.
-E o endereço?
-Não recebi.
-E como você sabe que é lá?
-Apenas sei.

Jorge continuou dirigindo e não demorou muito para chegarem à cidade. Lá, Jorge foi até a rua indicada e procurou a casa. Foi fácil achá-la, difícil foi fazer com que Willian saísse do carro.

-Will, você precisa ir. – Jorge o repreendeu.
-Você não pode fazer isso por mim?
-Não Willian, esse trabalho é seu. E por muito tempo ouvi você dizendo que não seria de mais ninguém.
-Certo. – Ele abriu a porta do carro, saiu e a fechou vagarosamente.
-Não se preocupe rapaz. Não há nada a temer.

Willian não respondeu, nem o olhou. Atravessou a rua contra gosto e relutante deu um salto para a pequena sacada no andar superior. Era uma casa bonita e a conhecia muito bem. Mas ninguém sabia do seu passado, ninguém nunca saberia.
A porta de vidro contornada de madeira clara estaria destrancada, e a cortina estava puxada. Era uma cortina lilás e branca, tão suave que teve medo de tocá-la e sujá-la. Sua mão alcançou a maçaneta e no mesmo instante um arrepio invadiu seu corpo. Ele queria gritar para que ela fugisse, queria sair correndo dali e queria até chorar. Ele não acreditava que iria transformá-la. Willian simplesmente não queria isso! Não até passar pela sua cabeça que ela estaria mais próxima a ele.
Fechou os olhos e respirou profundamente, empurrou a maçaneta para baixo e abriu a porta, passando por baixo da cortina delicada. Como ela crescera. Havia se passado tanto tempo assim? Seus cabelos negros se destacavam no conjunto de cama branco e com o edredom azul claro que eram como seus olhos quando era bebê. Ele olhou a cômoda branca com alguns frascos de perfume sobre ela e um espelho na parede ao lado. O guarda-roupa, igualmente de madeira branca, estava na parede ao lado da sacada. Ao lado do espelho tinha uma porta escura, que dava passagem para o banheiro e a porta em frente ao guarda-roupa era para o restante da casa.
Willian pretendia não fazer barulho, mas a noite estava tão silenciosa que ele acreditou que Jorge, do outro lado da rua, pudesse ouvir sua respiração pesada. Seus passos fizeram barulho, o que foi preocupante. Ele não pretendia acordá-la. Caminhou até a cama e observou seu rosto angelical. Não pôde resistir e tocou suas bochechas com o polegar. Ele a viu abrir os olhos bem poucos, estava inconsciente, com toda certeza. Sentou-se na lateral da cama e se curvou sobre ela, depositou-lhe um beijo na testa e mordeu seu pescoço. O sangue logo chegou a sua boca e ele pode ouvir um murmúrio de dor vindo da garota.
Então, num pulo, Willian se afastou dela e se levantou. Ele tinha a transformado! Ele tinha mesmo feito isso. Seu coração foi dominado pela culpa. O remorso do que havia feito estava forte que ele quase não pode conter as lágrimas. Em poucos minutos, aquela menina estaria mais pálida e sensível ao sol, teria a necessidade de tomar sangue e seus instintos não demorariam a se agitar. Quem sabe, em algum momento de insanidade ela se tornaria uma assassina! Mataria alguém apenas para de alimentar!
A garota se sentou na cama e sua respiração estava pesada, automaticamente levou sua mão ao local da mordida e seus pulmões pareciam enfraquecidos. Então ela avistou Willian próximo a porta de vidro aberta.
-Não grite! Está tudo bem!
-Quem é você? – Ela olhou a mão que estava tocando o pescoço e percebeu um pouco de sangue na palma – O que você fez? – Automaticamente puxou o edredom para se cobrir.
-Calma Kelly, não aconteceu nada.
-Como sabe meu nome? Quem é você? – A garota estava paralisada de medo.
-Quer mesmo saber? – Willian deu um sorriso de lado e revelou suas presas.
-Vampiro...? M-Mas...
-Sim mocinha, chegou a sua hora, seu destino foi mudado.

Kelly se admirou por alguns instantes, tocou seus braços, rosto, passou a língua pelos caninos e observou Willian.

-O que acontece agora?
-Você precisa vir comigo.
-Pra onde?
-Há um lugar onde todos os vampiros moram juntos.
-Nem te conheço, como posso confiar em você?
-Não há muitos maníacos que conseguem por implantes e sair transformando humanos. – Willian debochou.
-E por que eu? Há tantos outros humanos por aí.
-Existe um processo de seleção bem criterioso.
-Como vocês sabiam da minha existência? Que diabos me faz acreditar que é verdade?
-Insuportável igual a sua mãe. Cheia de teimosia e arrogância. É completamente igual à Tabata. Não herdou nada do seu pai não?
-Como você sabe da minha mãe? – Kelly se espantou.
-Sua mãe é uma das melhores pessoas que eu já conheci.
-Foi você quem a matou? – Certa raiva se encontrava nos olhos da garota.
-Não, não fomos nós. Na verdade ela morreu por ser uma de nós.
-Minha mãe não era uma vampira.
-Mas seu pai sim.
-Quem é você afinal de contas?! – Kelly alterou a voz.
-Shiu, não faça barulho. – Willian se aproximou.
-Não encosta em mim! – Ela se levantou e caminhou de costas até encostar-se à porta.
-Calma, não vou fazer nada.
-Quem é você? Como conheceu meus pais?
-Seu pai foi quem me transformou.
-Qual o seu nome?

Ele hesitou um pouco e sorriu. Tirou uma foto do bolso da calça e jogou por cima da cama da menina.

-Willian.

Ela alcançou o interruptor ao seu lado e acendeu a luz. Encarou o homem por alguns minutos e olhou para a foto em cima da cama. A imagem impressa ela conhecia muito bem. Era uma foto de um rapaz, cabelos negros e um pouco longos, olhos azuis claros e um sorriso lindo, no seu colo havia uma menina, um bebê. Uma tiara de pano enfeitava os cabelos escuros e curtos da bebê que vestia um vestido branco com babados lilás, sempre foram suas cores preferidas. O rapaz não havia mudado nada.

-Willian? Mesmo? – Seus olhos quase se encheram de lágrimas.
-Sim Kelly, sou eu. – Ele riu levemente.
-Por que você não apareceu? Por que não salvou meus pais? – Algumas gotas escorreram pelas bochechas.
-Me desculpa, eu não pude fazer nada.

Ela olhou mais uma vez para a foto e caminhou até o rapaz. Tocou seu rosto e depois o abraçou afundando seu rosto no peitoral e respirou profundamente.

-Obrigada tio. Vou me trocar – Ela se soltou dele e caminhou até o banheiro.

Alguns minutos depois Kelly saiu do banheiro e separou algumas roupas para levar e se dirigiram até a sacada. A lua ainda brilhante no céu iluminava a rua.

-Como vamos descer? – Seus olhos se arregalaram.
-Como vampiros – Willian saltou e olhou para cima.
-Você tem certeza?
-Não, desça pela escada – Ele riu.

A garota saiu do quarto, desceu as escadas e saiu pela porta da frente.

-Está ardendo, o que é isso? – Levou a mão ao local da mordida.
-Sua transformação.
-Parece que me injetaram ácido.
-É só agora, te garanto.
-Assim espero.

Willian conduziu-a até o carro, Kelly se sentou no banco traseiro e ele entrou na frente, se sentando ao lado de Jorge. Abriu uma pequena caixa de isopor e entregou para Kelly uma bolsa de sangue.

-O que é isso? – Ela apanhou a bolsa com certo nojo.
-Não dá pra trazer um corpo dentro da caixa.

A menina observou a embalagem

-Preciso disso?

-Precisa. Não é tão ruim quanto parece. – Sorriu e se virou para Jorge – Já podemos ir.

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